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quarta-feira, 29 de fevereiro de 2012

O vazio pacto fiscal da Europa.


Martin Feldstein é professor de economia em Harvard, foi presidente do conselho de assessores econômicos do presidente dos Estados Unidos, Ronald Reagan, e foi presidente do Gabinete Nacional de Análises Econômicas dos EUA. Escreveu este artigo especialmente para o VALOR ECONÔMICO de ontem. 

A força motora da política econômica da Europa é o "projeto europeu" de integração política. O objetivo é refletido no atual foco da União Europeia (UE) de criar um "pacto fiscal", que constitucionalizaria o compromisso dos países-membros com limites de déficit supostamente invioláveis. Infelizmente, o pacto é outro exemplo da subordinação da realidade econômica da Europa ao desejo dos políticos de se vangloriar sobre o avanço em direção a uma "união ainda mais forte".

O plano sobre o pacto fiscal evoluiu rapidamente nos últimos meses, deixando de ser uma "união de transferências", politicamente impopular, para tornar-se um perigoso projeto de austeridade fiscal e, por fim, uma versão modificada do falecido Pacto de Estabilidade e Crescimento de 1997. No fim das contas, o acordo que emergirá pouco fará para mudar as condições econômicas da Europa.

A forma mais provável de acerto parece ser um acordo bastante moderado obrigando cada país a equilibrar seus orçamentos e que seu descumprimento resulte em penas automáticas, embora seja difícil imaginar quando um país descumpre suas metas

A primeira-ministra da Alemanha, Angela Merkel, de início, propôs a "união de transferências", na qual seu país e outras economias mais fortes da região do euro transfeririam fundos ano após ano para a Grécia e outros países em necessidade, em troca da autoridade de regulamentar e supervisionar os orçamentos e a arrecadação tributária dos governos auxiliados. A população alemã rejeitou a ideia de transferências permanentes dos contribuintes alemães para a Grécia, enquanto a população e as autoridades gregas rejeitaram a ideia de que a Alemanha controle a política fiscal do país.

O próximo passo foi o plano fiscal acertado em Bruxelas no fim de 2011, que abandonou completamente a ideia de uma união de transferências em favor de um acordo em que cada país da região do euro equilibraria seu orçamento. Pelo esquema, seriam impostas penas financeiras "automaticamente" a qualquer país que infringisse o compromisso. Com orçamentos equilibrados em todos os países, então, não haveria necessidade de transferências fiscais.

Como exatamente, no entanto, se definiria orçamento equilibrado? Em carta para as autoridades que negociam o acordo oficial, Jorg Asmussen, membro alemão do Conselho Executivo do Banco Central Europeu (BCE), enfatizou que um orçamento equilibrado significa exatamente isso. Se um país tiver déficit orçamentário porque enfrenta algum mau momento econômico cíclico que derrubou a arrecadação tributária e elevou as transferências de benefícios sociais, ainda assim, será obrigado a elevar impostos e cortar gastos para voltar a ter um orçamento equilibrado.

Se essa proposta fosse de fato adotada, teria como consequência tornar pequenas recessões em grandes retrações econômicas.

A forma mais provável de pacto fiscal, atualmente, parece ser um acordo bastante moderado obrigando cada país a "equilibrar seus orçamentos ao longo do ciclo econômico". Embora seu descumprimento, em teoria, resulte em penas financeiras automáticas, é difícil imaginar como seria possível determinar que houve descumprimento em um país como a Espanha. Em que momento, no futuro, se obrigaria a Espanha, com índice de desemprego persistente em mais de 15%, a elevar impostos e diminuir as transferências sociais? A decisão de obrigar a Espanha poderia caber à Comissão Europeia, com o que se trataria de uma decisão política, em vez de uma condição técnica "automática" como prometido por seus defensores.

Se essa for a essência do pacto fiscal que vai acabar sendo acertado, não terá efeito previsível no comportamento dos países da região do euro. Seu único efeito será permitir que líderes políticos da região do euro possam sair dizendo que criaram uma união fiscal e, portanto, direcionaram a Europa a uma união política mais coesa, o que é seu objetivo final.

Uma união fiscal concebida dessa forma, no entanto, é completamente diferente do que a maioria das pessoas entende pelo termo. Nos Estados Unidos, por exemplo, o governo central arrecada cerca de 20% do Produto Interno Bruto (PIB) do país e paga mais ou menos o mesmo. A centralização dos impostos e gastos cria um estabilizador automático para qualquer região que passe por um mau momento econômico: os residentes da região afetada pagam menos dinheiro a Washington e recebem mais transferências.

O papel fiscal centralizado nos EUA também permite que todos os Estados operem com orçamentos verdadeiramente equilibrados, modificados apenas por fundos relativamente pequenos para os "dias chuvosos".

Embora o atual processo político europeu não vá criar uma forte disciplina fiscal, os mercados financeiros provavelmente obrigarão os governos da região do euro a reduzir suas dívidas soberanas e limitar déficits fiscais. Durante os primeiros dez anos da moeda única, a crença dos investidores do setor privado na uniformidade de todos os bônus soberanos da região do euro manteve as taxas de juros relativamente baixas nos países periféricos, mesmo enquanto seus governos acumulavam grandes déficits e dívidas maciças. Os investidores não repetirão o erro: mordidos uma vez, agora serão duplamente cautelosos.

Para os governos da região do euro, isso significa que os mercados financeiros colocarão em prática o que o processo político não consegue. O pacto fiscal da UE, não importa qual seja sua forma, será pouco mais do que uma questão secundária

terça-feira, 17 de janeiro de 2012

Como criar uma depressão.


Martin Feldstein é professor de economia em Harvard, foi presidente do Conselho de Assessores Econômicos do ex-presidente dos Estados Unidos Ronald Reagan e foi presidente do Gabinete Nacional de Análises Econômicas dos EUA. Copyright: Project Syndicate, 2012. Este artigo foi publicado hoje no VALOR ECONÔMICO. 


Os líderes políticos europeus podem estar prestes a acertar um plano fiscal que pode levar a uma grande depressão, se for colocado em prática. Para entender por que vale a pena comparar como os países europeus reagiram a declínios na demanda antes e depois do euro.

Vejamos como a França, por exemplo, teria reagido a um declínio substancial na demanda por suas exportações nos anos 90. Se não houvesse resposta do governo, a produção e o emprego recuariam. Para evitar isso, o Banco da França reduziria os juros. Além disso, a queda nas entradas automaticamente reduziria a arrecadação tributária e aumentaria vários "pagamentos de transferência" governamentais. O governo poderia suplementar esses "estabilizadores automáticos" com novos investimentos ou com a queda dos impostos, aumentando ainda mais o déficit fiscal.

Além disso, a queda na demanda pelas exportações francesas automaticamente levaria ao declínio do valor do franco em relação às outras moedas, sendo que a redução das taxas de juros também desvalorizaria a divisa francesa. Essa combinação de mudanças monetárias, fiscais e de câmbio estimularia a produção e o emprego, evitando uma alta significativa do desemprego.

Quando a França adotou o euro, contudo, dois desses canais de reação foram fechados. A moeda deixou de poder desvalorizar-se em relação a outras divisas da região do euro. A taxa de juros na França - e em todos os outros países do euro - agora é determinada pelo Banco Central Europeu (BCE), com base nas condições da demanda dentro da união monetária como um todo. Portanto, a única política anticíclica disponível na França é a fiscal: reduzir a arrecadação com impostos e aumentar os gastos.

Embora essa resposta implique em um déficit orçamentário maior, os estabilizadores fiscais automáticos são particularmente importantes agora que os países da região do euro não podem usar a política monetária para estabilizar a demanda. A falta de ferramentas monetárias, aliada à ausência de ajustes na taxa de câmbio, também poderia justificar alguns cortes cíclicos de impostos e aumentos nos gastos.

Infelizmente, muitos países da região do euro permitiram que os déficits fiscais subissem nos bons momentos econômicos, em vez de permiti-lo apenas quando a demanda estava fraca. Em outras palavras, a dívida nacional desses países cresceu alimentada por déficits orçamentários tanto "estruturais" como "cíclicos".

Os déficits orçamentários estruturais foram alimentados nos últimos dez anos pela surpreendente falta de reação das taxas de juros da região do euro às diferenças nacionais na política fiscal e nível de endividamento. Como os mercados financeiros deixaram de ver diferenças de risco entre os países da região do euro, as taxas de juros dos bônus soberanos não refletiram o excesso de endividamento. A moeda única também impediu que a taxa de câmbio pudesse sinalizar diferenças de extravagância fiscal.

A confissão da Grécia em 2010, de que havia subestimado significativamente seu déficit fiscal, foi um alerta para os mercados financeiros, o que levou ao aumento substancial dos juros dos títulos de dívidas soberanos em muitos países do euro.

O encontro de cúpula da União Europeia, em Bruxelas, no início de dezembro tinha como objetivo evitar uma acumulação de dívidas desse tipo no futuro. Os chefes de governo dos países-membros concordaram em limitar os déficits fiscais "estruturais" a 0,5% do Produto Interno Bruto (PIB), com a imposição de penas aos países cujos déficits fiscais totais superem os 3% do PIB - um limite que incluiria tanto o déficit fiscal como o estrutural, o que, portanto, restringiria o déficit cíclico a, na prática, 3% do PIB.

Negociadores agora trabalham os detalhes para o próximo encontro, no fim de janeiro. Uma parte importante do acordo sobre os déficits em dezembro é que os países podem ter déficits cíclicos superiores a 0,5% do PIB - uma ferramenta importante para compensar declínios na demanda. Não está claro se as penas para os déficits totais que superarem os 3% do PIB seriam dolorosas o suficiente para os países preferirem não promover aumentos nos estímulos fiscais anticíclicos.

Preocupante é a reclamação formal do BCE de que as regras propostas não são duras o suficiente. Jorg Asmussen, importante membro da comissão executiva do BCE, escreveu aos negociadores que os países deveriam ter permissão para exceder o limite de déficit de 0,5% do PIB apenas em tempos de "catástrofes naturais e situações de emergência grave" fora do controle dos governos.

Se esse texto for adotado, eliminaria os ajustes fiscais cíclicos automáticos, o que levaria uma espiral negativa da demanda e a uma grave depressão. Se, por exemplo, as condições no resto do mundo causarem um declínio na demanda por exportações francesas, a produção e o emprego na França cairiam. Isso reduziria a arrecadação com impostos e aumentaria os pagamentos de transferência, facilmente levando o déficit fiscal para mais de 0,5% do PIB.

Para acabar com o déficit cíclico, a França teria de elevar tributos e cortar gastos públicos. Isso reduziria ainda mais a demanda, provocando mais declínios na arrecadação e novos aumentos nas transferências - e, portanto, traria um déficit fiscal ainda maior, exigindo maior aperto fiscal. Não está claro o que acabaria com essa espiral negativa de aperto fiscal e queda na atividade.

Se adotada, essa proposta poderia produzir índices de desemprego muito altos - em resumo, produziria uma depressão.

Seria muito mais sensato concentrar-se na diferença entre déficits estruturais e cíclicos e permitir déficits que sejam resultantes de estabilizadores automáticos. O BCE deveria ser o árbitro dessa distinção, publicando estimativas de déficits estruturais e cíclicos.

Itália, Espanha e França têm déficits superiores a 3% do PIB, mas não são déficits estruturais. Os mercados financeiros estariam mais bem informados e confiantes se o BCE indicasse o tamanho dos déficits estruturais reais e mostrasse como atualmente estão em queda. Para os investidores, essa é a característica essencial da solvência fiscal. 

A importância de debater o PIB nas eleições 2022.

Desde o início deste 2022 percebemos um ano complicado tanto na área econômica como na política. Temos um ano com eleições para presidente, ...